Vai longe o tempo em que poderosas empresas olhavam para outros players unicamente como concorrentes a serem massacrados na primeira oportunidade. Porém, nem mesmo parcerias para solidificação de mercados e associações de setores poderiam sonhar com o desenho que hoje vemos em muitas áreas: ecossistemas complexos que atraem os mais diversos talentos empreendedores e geram valor de maneira coletiva também para múltiplos mercados consumidores.
Pode parecer um pouco abstrato – e é ! –, mas um exemplo ajuda a entender esse movimento. Quase todo mundo usa aplicativos de transporte no Brasil, certo? Uber, 99, Cabify, Televo… O próprio fato de eles existirem já nos dá uma ideia de conjunto para essas empresas.
Agora, quantos motoristas você conhece que atuam em mais de um aplicativo? Aposto que vários. E é evidente que a própria formação e capacitação desses motoristas – sim, ela existe, vide a queda de qualidade do atendimento do Uber após sua grande onda de expansão – é algo de alguma forma compartilhado, pois esses trabalhadores “aprendem” seus ofícios à medida que trabalham para várias empresas diferentes.
Nesse ecossistema, cada vez que uma inovação surge – por exemplo a necessidade de se higienizar os carros com produtos hospitalares durante a pandemia –, o conjunto como um todo aprende. E as plataformas, neste caso, correspondentes a cada uma das empresas que contratam motoristas, vão se adaptando de acordo com o momento.
O interessante é que infinitos setores já foram tomados por esse tipo de abordagem de negócios, que ganhou até o nome de “platform thinking”, algo como “design de plataformas”, ou “plataformização”. Em resumo, trata-se aqui de pensar a partir do ecossistema e, portanto, facilitar a integração, compor serviços, orquestrar recursos e estimular a co-criação entre os agentes.
Só para lembrar exemplos mais conhecidos, temos áreas como logística, produção de conteúdo, design de materiais e produção gráfica com ecossistemas complexos e bastante desenvolvidos.
Para pensar essas questões, o estudo da Deloitte “Plataformas e ecossistemas: Impulsionando a economia digital”, produzido em colaboração com o Fórum Econômico Mundial, refletiu sobre os novos modelos de negócios emergidos a partir dos ecossistemas digitais, destacando possibilidades e benefícios que esse novo modo de interação em mercados pode trazer. Recomendamos muito a leitura, que pode ser baixada aqui, no site da Deloitte.
E para quem quer entender um pouco mais sobre como um executivo deve agir ao pensar negócios nesse universo, o relatório traz um capítulo-resumo especial, que reproduzimos a seguir:
Guia para navegar em um mundo de ecossistemas digitais
(Seis questões estratégicas que os executivos precisam considerar)
- Como meu setor está sendo transformado como resultado das novas oportunidades disponíveis por meio de ecossistemas digitais atuais ou em desenvolvimento?
- Que papel devo desempenhar em cada um dos ecossistemas considerados?
- Qual é o objetivo final da minha participação geral no ecossistema? O que procuro alcançar em termos do objetivo deste ecossistema? Como minha oferta se compara a de outras, vista do ponto de vista de meus complementadores?
- Que ponto problemático estou resolvendo para o cliente final corporativo geral?
- Quais recursos de dados e análises devem ser desenvolvidos para atender melhor os clientes do meu ecossistema? Como eles informarão a questão de quem são os membros certos do ecossistema e quais pacotes oferecer?
- Como posso ter certeza de que estou formando um verdadeiro ecossistema, em vez de construir um sistema do ego, que me coloca no centro?
Entendeu como a mentalidade empreendedora muda, absorvendo totalmente a ideia de produzir em conjunto? Pois isso funciona não só para executivos, como para todos os setores da empresa, que passam a ser vistos também como parte do ecossistema, não só como parte de uma plataforma em si.
Upgrade no serviço público
Um dos capítulos mais instigantes do estudo trata de como a mentalidade dos ecossistemas pode aumentar os ganhos de qualidade na fronteira de atuação entre empresas privadas e serviço público. É o que podemos apreender dessa fala de Hamid Akbari, diretor executivo da Blanc Labs e presidente da Velocia, Canadá, que deixamos como reflexão final:
“Alguns dos problemas mais importantes que nossas sociedades enfrentam – como transporte e mobilidade – permeiam diferentes áreas políticas e conectam os setores público e privado de maneiras novas e estimulantes. Nosso objetivo é criar um ecossistema aberto que recompensa o comportamento positivo dos passageiros urbanos, que respondem aos incentivos que tanto o setor público quanto as organizações do privado podem oferecer. Nosso trabalho é fornecer uma plataforma que conecte os agentes, incentive a colaboração e melhore a mobilidade urbana.”