Um traço marcante diferencia a Geração Z e a geração diretamente anterior, a dos chamados “millennials”: os profissionais mais novos acreditam que cabe às instituições educacionais – e não aos empregadores e empresas – o papel de prepará-los para os desafios da chamada Indústria 4.0, a indústria que já é mais do presente do que do futuro.
Esses dados vêm da pesquisa “Millennial Survey 2019”, da Deloitte, que colheu respostas de cerca de 3 mil pessoas da geração Z (neste caso, nascidos entre janeiro de 1995 e dezembro 2002) e de 13.416 millennials (estes com nascimento entre janeiro de 1983 e dezembro de 1994). Os dados foram coletados em 10 países, incluindo o Brasil.
É interessante notar que os números mostram uma verdadeira inversão entre as gerações. Entre a geração do milênio, 30% dizem que as empresas têm a maior responsabilidade pela preparação dos trabalhadores para as novas demandas do mercado. As instituições de ensino vêm em seguida, com 24%. Já entre os entrevistados da Gen Z, 36% depositam sobre as instituições de ensino – como faculdades, universidades e ensino médio, esse papel de ensinar novas habilidades, deixando ao grupo dos empregadores 25% da responsabilidade.
E vale dizer que o desafio da formação é encarado com consciência por esses profissionais. Apenas um em cada cinco entrevistados, em média, acredita ter todas as habilidades e conhecimentos que precisam para um mundo moldado pela Indústria 4.0. Além disso, 70% deles disseram que podem ter “apenas algumas ou poucas das habilidades necessárias” e precisarão desenvolver seus próprios recursos para aumentar seu valor.
Inovação e flexibilidade
Apesar do desafio de formação para adquirir habilidades e competências, 49% dos millennials acreditam que as novas tecnologias vão aumentar os empregos disponíveis para eles. Outros 25% esperam que a Indústria 4.0 não tenha impacto e apenas 15% temem perder vagas ou parte de suas responsabilidades de trabalho.
Esse quadro causa certa curiosidade, principalmente se lembrarmos que muitos empregos mudaram significativamente nos últimos anos devido às tecnologias. Em alguns setores, a inteligência artificial agora está realizando tarefas que definiam postos de trabalho, forçando as pessoas a exercerem habilidades diferentes e exclusivamente humanas. Pelo visto, millennials já encaram essa dinâmica como natural, não dando ênfase a possíveis pontos negativos.
Mas se engana quem pensa que esse dinamismo todo é suficiente para os millennials. É o que mostra mais outro dado interessantíssimo da pesquisa: para 49% dos pesquisados, abandonar seu atual emprego é algo que fariam nos próximos 2 anos, se tivessem oportunidade. No relatório de 2017 da Deloitte, os resultados apontavam só 38%!
Outro indicativo dessa tendência a relações mais fluidas de trabalho é o interesse pela “gig economy”, ou “economia sob demanda”. Neste caso, a grande maioria dos millennials e Gen Zs indicou que não hesitaria em trabalhar como freelancer ou por contrato. No geral, a economia gig atrai quatro a cada cinco millennials e Gen Zs!
Meu dinheiro, minhas regras
E se o modo de conquistar dinheiro é uma marca dessas gerações, o de gastá-lo é igualmente revelador. Mesmo estando, como todos os outros consumidores, suscetíveis à publicidade, os millennials e Gen Zs iniciam e interrompem relacionamentos com empresas por motivos muito pessoais, frequentemente ligados ao impacto positivo ou negativo de uma empresa na sociedade.
Como exemplo, 42% dos millennials disseram que já começaram ou aprofundaram um relacionamento comercial porque perceberam que os produtos ou serviços de uma empresa possuíam um impacto positivo na sociedade ou no meio ambiente. Já falando não sobre impacto social, mas sobre ética, 37% dos entrevistados disseram que “pararam ou diminuíram” um relacionamento comercial em razão de a empresa não apresentar um comportamento ético.
Em paralelo a esses dados críticos, a série histórica da Deloitte mostra inclusive uma queda acentuada na confiança dos millennials quanto ao papel positivo das empresas na sociedade. Depois de quatro anos consecutivos no patamar de 70%, caindo para 61% em 2018, o número de entrevistados que disse que os negócios têm um impacto positivo na sociedade caiu para apenas 55% na pesquisa atual. Destaque para os países emergentes, que tiveram quedas ainda mais acentuadas.
Segundo a Deloitte, essa mudança é impulsionada, em parte, pela percepção de que as empresas se concentram em suas próprias agendas, em vez de considerarem a sociedade em geral: 76% concordam com esse sentimento. Já os que concordam que os empresários não têm outra ambição além de querer ganhar dinheiro são 64%.
Descrédito na política
E se as empresas se encontram sob um olhar atento dos millennials, a política e suas lideranças ocupam um patamar bem mais baixo, de total descrédito. Os líderes políticos foram citados como o grupo menos provável de ter tido um impacto positivo (19%) e o mais provável de ter tido um impacto negativo em suas vidas (57%).
Além disso, sete em cada 10 millennials acreditam que, em seu governo, os líderes se concentram em suas próprias agendas ao invés de defender os interesses dos cidadãos. Para 63% dos entrevistados, seus líderes não têm ambição além de reter ou aumentar seu próprio poder.
Em defesa do futuro
Em setembro de 2019, portanto, antes da pandemia do Covid-19, dezenas de milhares de pessoas, lideradas por estudantes, fizeram mais de 5.000 atos em pelo menos 156 países contra o aquecimento global.
A força do movimento é coerente com mais um dado da pesquisa da Deloitte, que aponta “mudanças climáticas / proteção do meio ambiente / desastres naturais” como o principal desafio a ser enfrentado pela sociedade. Vinte e nove por cento dos entrevistados citaram essa como uma preocupação, sete pontos à frente da segunda maior preocupação, desigualdade de renda / distribuição de riqueza.